O cinema ocupa uma posição ambígua na obra de Fernand Deligny. O cinema é ao mesmo tempo central e marginal. A prática do cinema é convocada em suas diferentes ‘tentativas’ e ocupa uma posição central nelas sem ser propriamente falando vital para a sua sobrevivência. Nas diferentes tentativas, a energia posta na prática cinematográfica não necessariamente resulta na produção de um objeto-filme, mas a energia é sobretudo investida nos processos em torno dele – processos que são também intimamente relacionados com as outras atividades das tentativas, como o acolhimento de adolescentes e a implicação deles em situações de aprendizado de um trabalho, ou o acolhimento de crianças autistas severas e a produção coletiva de pão, por exemplo. Isso não implica que o filme não seja importante, mas esses elementos ajudam a emancipar o filme da temporalidade da produção cinematográfica habitual. Liberada da necessidade do filme-produto, Deligny e seu coletivo podem se dedicar às outras atividades nas quais o filme porvir aconteceria. E, ao mesmo tempo, os diferentes projetos de filme, longe de serem supérfluos, têm um papel simétrico e ajudam a estruturar de um modo inteiramente diferente as tentativas, emancipando-as de seus supostos objetivos – curar ou normalizar pessoas psicóticas; reeducar sujeitos desviantes.

Informações

O seminário decorre online, às 19h30 (horas de Lisboa)
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